sábado, 21 de dezembro de 2013

Beija-flor

O meu amor é como um beija-flor:
pequeno,
frágil,
belo...
Mas que canta feio.
E o voo soa como besouro...
Também dependo de muitas
Muitas flores
Das quais só guardo minúsculas gotas de néctar...

Frio

À noite choveu.
E senti tanto frio
Que pensei que era eu que chovia.
A rede estava fria,
Rede não foi feita pra frio!
E eu penso cá comigo se eu fui...

Paraíso

Tantas orquídeas pedindo para ser fotografadas,
E eu esperando você
Diante da câmera.

As aves pedem...E eu digo: não!
As cachoeiras murmuram, pedindo baixinho...E eu digo: não!
Só você...
Guardo minhas lentes
Só para você.

Esse paraíso, o resto,
Eu curto agora. Sem câmera.

O paraíso que é você
Eu registro...
Paraíso fugidio...

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Dezembro

Sempre dezembro,
com seus finais dezembrais...
A ilusão do fim da ilusão de um ano,
Quando cada minuto é um ano -
E o último segundo desse minuto
Não tem papai noel nenhum
E nem promoção nas Lojas Americanas...

Tempus fugit...

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Noite sem luar



Eu todo me abandono...
Nesta noite noite sem luar, sou o luar...
Mas não um luar em mim,
Um luar lá fora.
Esta noite eu apenas me ilumino,
Pois sou apenas corpo deitado na grama
E minha vida está meio longe.
Aonde está você a quem me entreguei?
Entrega tão tardia que mais parece uma lembrança meio louca -
Uma lembrança de ontem
Que soa como lembranças velhas de vinte anos.
Uma lembrança velha que é nova,
Que nunca foi,
ou melhor,
foi...Agorinha mesmo...

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Quixeramobim

Quando nasci
Não sabia que havia nascido no centro do mundo.
Filho legítimo da caatinga,
Mas de pai desconhecido...
Talvez minha mãe tenha sido fecundada pela constelação de escorpião - estrelas que velam as minhas noites e que são sempre as primeiras que vejo quando me permito olhar pra cima.
Talvez tenha sido fecunda pela água, tão rara que não canso de admirar o milagre que é sua queda do céu!
Ou pelas pedras dessa paisagem, cujas formas sempre alimentaram minha fantasia...
Agradeço o fato de não ter pai
E assim poder vê-lo em todo canto. 
Um pai feito de sonho e melancolia
Mas sempre presente
Aonde quer que eu vá...
Nasci no centro do mundo.
Quixeramobim, minha Macondo!
Minha Lisboa infinita!
Minha Dublin chuvosa em meio aos cactos.
O sol se ajoelha diante de ti todo fim de tarde
E repousa suas mãos flamejantes na serra de Santa Maria
Para espalhar essa luz entre dourada e laranja
Nos teus campos secos.
A caatinga dorme, esperando o regresso do marido
Que vem com as chuvas...

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Perda

Sentimento de perda
é a sensação
de perder
a sensação
de ter
algo.

Possuir
é ter
a sensação
de ter.

Iludir-se
é ter sensações...

sábado, 3 de agosto de 2013

Sonhei

Sonhei com você
E acordei estranho.
Por que sonhamos, de vez em quando, com coisas inesperadas?
Você não está mais aqui
Nem realmente e nem metaforicamente...
Meu coração está alegremente vazio,
Como uma sala arrumada para novos convidados.
Você já esteve lá, como senhor e dono,
Mas agora é um retrato pendurado na parede...
Lembrança terna das coisas eternas que se acabam.

quarta-feira, 31 de julho de 2013

Paixão

A paixão se foi como chegou, de maneira abrupta...Quando o encontrei, fiquei na expectativa de sentir toda a ansiedade que sua presença havia inspirado em outros momentos...
Mas não veio ansiedade nenhuma.
O prazer foi bom por ter sido mero prazer e não prazer alfinetado por sonhos desmesurados.
Prazer bom, com sonhos pequenos, se é que se pode chamá-los de sonhos.
O beijo ficou só no beijo.
A mão tocou só o corpo.
O corpo estava lá presente...
Em peso,
temperatura
e movimento.
E os olhos não eram fossas para profundidades metafísicas

- eram apenas dois lindos olhos castanhos.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Solidão

A melhor solidão é aquela sem expectativas.
Essa tem gosto de liberdade...
Quando se tem expectativas, a mente não descansa onde o corpo está.
A mente gosta de ficar perto daquilo que ela deseja
E o corpo fica exausto, já que o que a mente deseja não está perto.
O corpo pisa no chão.
A mente alça voo...

sábado, 6 de julho de 2013

Quando

Se não agora, quando?
E quando nunca puder ser agora?
Ou quando o agora puder ser nunca...
Em suspensão...
Sem presente...
Sem tempo...
Sem resolução...

Queda livre,
Mas sem saber se para cima ou para baixo.
Vertigem,
Não saber se quando se olha se olha para frente ou para trás...
Terá sido uma lembrança do que passou
Ou uma ansiedade pelo que se pode passar?
...
Penso demais...

Interior

Será que eu aguentaria uma vida no interior de novo - longe da cidade grande?
Se estivesse acompanhado, sem dúvida. Mas sozinho, seria um desafio...
As cidadezinhas aqui da serra são muito charmosas, limpas, organizadas, com as pessoas educadas e gentis...Mas o povo é muito conservador.
Bom, conservadorismo não seria problema...
Um pouco de conservadorismo faz bem....Um furacão é muito dinâmico, mas não se tem chão para construir nada...
Penso, penso.
A noite vai chegando, o frio vai aumentando, as estrelas vão chegando lentamente antes de transformar o céu num cobertor de estrelas.
O galo já subiu no topo da árvore daqui de frente.
O cachorro já olha pra mim, perguntando: "Já tá na hora da janta?"
Já botei a comida do gato.
Já tirei as minhas roupas do varal para não se molharem à noite...

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Fortaleza

90% das coisas me afastam de Fortaleza.
Mas os 10% restante são muito fortes...Mas se não houver 10%, não haverá razão  nenhuma para ficar.
Meu coração tem razões irracionais.
Mas seria bom que não tivesse também esperanças irracionais
ou desejos irrealizáveis.

A solidão faz minha cabeça virar de um lado para o outro.
O meu silêncio faz eco na floresta.
E minha ansiedade não se queima no fogão à lenha...
Debaixo do cobertor, somente sonhos quentes
- que por serem sonhos, são frios. 

domingo, 30 de junho de 2013

Amores e outras

"O TEU SILÊNCIO é uma nau com tôdas as velas pandas... 
Brandas, as brisas brincam nas flâmulas, teu sorriso... 
E o teu sorriso no teu silêncio é as escadas e as andas 
Com que me finjo mais alto e ao pé de qualquer paraiso... 

Meu coração é uma ânfora que cai e que se parte... 
O teu silêncio recolhe-o e guarda-o, partido, a um canto..."
(A Hora Absurda - F. Pessoa)

Tenho pra mim que todos os encantos se desfizeram no ar
e a bruma perfumada da floresta vai atrás dos seus rastros.
Mas a noite caiu mas rápida e mais insana, ainda que silenciosa,
e encontrou meu coração partido na varanda...

Não consegui recolher os cacos, pois eram muitos.
Apenas os varri para o jardim...para que os passarinhos os comêssem!
Mas algo bate aqui dentro, não sei...
Talvez, seja o eco dos outros corações partidos antes...

Distância, distância...beleza e inferno 
Das montanhas do Espírito Santo.

Escorpião

Por que será que sempre que olho pro céu
a constelação de escorpião é sempre a primeira coisa que vejo?
Quando estava na Europa nunca conseguia vê-la
por que aquele céu é meio estranho...
Olhava pro céu e não reconhecia nada!
Até que um dia, às 4 da manhã, na porta da sala de meditação em Plum Village,
vi-a surgindo no horizonte...Imensa, linda...
Será que é por ela fazer um S?

Chão de estrelas

Sozinho na varanda.
São sete e meia da noite, mas parece meia-noite.
Quando olhei pro céu me lembrei da música
E entendi o que é um chão de estrelas...
As minhas roupas, no varal.
O cachorro vira-lata perto, me fazendo companhia...

"Nossas roupas comuns dependuradas
na corda, qual bandeiras agitadas,
parecia um estranho festival!
Festa dos nossos trapos coloridos
A mostrar que nos morros mal vestidos
é sempre feriado nacional..."

Linda, antiga, meiga, doce...

Na minha varanda, um chão de estrelas...
E ninguém no barracão à minha espera.
Apenas elas como esperança...

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Já fui rio

Pháp Giang foi o nome me dado por Thich Nhat Hanh. Giang significa rio e pháp, Dharma, em sino-vietnamita. Meu amigos franceses me chamavam de Frère Rivière, alguns amigos ingleses me chamavam de Brother River e os vietnamitas brincavam me chamando de Brother Amazon.
Nunca pensei ter merecido esse nome. Os nomes de monges, segundo se diz, são como koans. Deve-se refletir sobre ele e descobrir algo sobre si mesmo.
É a minha herança da minha época monástica. Todos os dias penso sobre isso, afinal, rio é uma grande metáfora.
Serei eu um rio?
Terei sido um rio?
Que rio é esse que corre dentro de mim?
Que rio é esse que eu navego todos os dias?
Que fluxo é esse, além de todos os meus pensamentos, é claro, que, ás vezes, toma conta de mim?
O rio corre e eu corro e tento não não correr.
Não procuro ver as margens como opressão, mas como algo que está ali para eu transformar - afinal, não há margens que resistam ao rio, depois de algum tempo.
E as margens viram sedimentos.

Rios de lembranças também.
Rios de vidas, de carros, de água.
Rios que se transformam em lagos, lagos que que se movem e se transformam em rios.
Sou um rio, se sou algo...Como todo mundo.
A diferença é que fui rio, uma vez.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Manifestações

O país está pegando fogo, parece...
Mas minha única tv é o mato em torno de casa.
Minha internet é lenta...Só sei das coisas pelo twitter, que é leve de carregar.
Pra quem está envolvido parece que todos estão envolvidos.
Mas eu estou envolvido apenas pela manhã.
Dedico minhas meditações a quem está na rua.
No resto do dia cuido de mim, do cachorro, do gato e da floresta...

Folhas

Descobri que inhame parece uma planta decorativa.
Sempre confundo uma imbaúba nova com um mamoeiro...Coisa de nordestino.
O barulho mais característico daqui é a queda das folhas da imbaúba.
São folhas grandes e pesadas e fazem muito barulho.
No começo sempre pensava que era outra coisa, um bicho.
Elas fazem um barulho quando quebram e quando caem...

Amanhece

O beija-flor já veio visitar o jardim.
os jacus já espreitam.
o cachorro já olha olha com olhar de interesse...
Até um canário já passou por aqui.
Amanheceu na Capijuma...

Já pendurei o gonzo no pescoço do gato
(os passarinhos sempre irão saber quando ele estará por perto!)
Já botei a comida do cachorro
e espalhei farelo de pão pras galinhas.

Agora é a minha vez.
Pó de café, abacate, pão...
geléia de laranja, amendoim aveia...
Vou assistir ao jardim na varanda.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Lua

Como dizia uma música que eu costumava ouvir na Rádio Difusora Cristal de Quixeramobim :
"A lua vem surgindo cor de prata
No alto da montanha verdejante...
A lira de um cantor em serenata
Reclama da janela a sua amante!
Das cordas de um sonoro violão
Confessa um seresteiro à sua amada
O que dentro lhe dita o coração"
Orlando Silva

Amores e outras

O meu amor é como um espelho ao sol.
Ilumina mas não se aquece...

A minha dúvida é como um vela.
Não ilumina muito, mas queima...

Estar só é como estar acompanhado de todo mundo.
Mas todo mundo não pode estar na sua cama...

Aprendiz

É um lugar comum se dizer que no zen é preciso ter mente de aprendiz. Parece fácil. Principalmente quando se está falando de um estado da mente em que se está aberto à novidades...
O problema é quando falamos de abertura para sermos ensinados. Especialmente pessoas como eu que sempre sabem de tudo...
Nunca queremos um mestre. Queremos sempre ser  o nosso próprio mestre.
Até aparecer o ponto cego...

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Solidão

Estou no mato com um cachorro.
E com um gato.
Afora todos os bichos da floresta que estão lá fora.
É.
É uma solidão meio que acompanhada...

domingo, 23 de junho de 2013

Escorpião

O meu amor mora em Escorpião,
Minha constelação favorita.
Mesmo que não seja esse o signo dele...

No frio, eu fico observando...
Prefiro o escorpião à lua...
Tirei uma foto, uma noite dessas,
para ofertar como uma flor...
Besteiras da solidão.

domingo, 26 de maio de 2013

Água

Quando eu era pequeno, no sítio onde eu vivia, a gente tinha uma cisterna bem grande. Lembro-me de ver aquela lage de cimento sem entender o que era. Alguém tinha me dito que era pra guardar água...Mas água de onde?
Um dia choveu bastante forte. Vi um certo rebuliço perto da cisterna. O filho da empregada subia no lado de fora da casa para ajeitar as calhas que deviam aparar a água do telhado. Depois tinha que pegar um dos canos para levar a água até a cisterna. Mas, antes, era necessário esperar um pouco para que a água primeiro lavasse o telhado e  depois, colocar um pano na boca do cano pra filtras as sujeiras grandes das telhas.
Foi nesse dia que fiquei sabendo o por quê das cisternas e das calhas ao redor da casa.
Muitas vezes não tinha água na torneira e tínhamos que tirar água dali.
A empregada pegava um balde feito de latas de óleo do pajeú e colocava num pote enorme, maior que eu, que ficava num dos cantos da cozinha. Daí cobria o pote com um pano de prato e usava uma tampa velha de alumínio para segurar. Em cima do pote ficava os canecos pra gente pegar água direto dele.
O pote era grande e frio e eu adorava ficar abraçado nele nas tardes quentes. Eu e os cururus que se abrigavam embaixo dele...

Chuva

A chuva era um dos eventos mais marcantes durante minha infância. Ouvia-se o barulho das pessoas gritando de alegria por toda a cidade.Esperávamos um pouco para ver se ela ia durar e, então, corríamos para nos encontrar na pracinha em frente lá de casa. Claro, o objetivo era achar um lugar bom para tomar banho...
Saíamos correndo pela cidade, aproveitando cada telhado que se transformava em cachoeira. Íamos andando e parando em cada biqueira...
Mas o melhor era a igreja. Parecia que todos os meninos e meninas da cidade instintivamente corriam para lá. Dizíamos "Vamos tomar banho nos jacarés da igreja!!". Alguém de fora cidade jamais iria entender essa imagem. Mas a ´verdade é que a água do telhado da igreja era drenada pra fora por umas biqueiras em forma de jacaré...
Eu não entendia bem, na época, por que tanta alegria por causa da chuva... Na maioria das vezes a chuva durava poucos minutos...
Mas para mim era um milagre. Todo mundo falava tanto de céu, especialmente naquela época que milhares de outros meninos morriam diariamente por causa da seca e da fome. Mas para mim, água era a única coisa visível que vinha do céu. Quando olhava pro céu não procurava por Nossa Senhora, procurava por água. De algum modo, a água subia ao céu e fazia aqueles tufos de algodão que a gente via passar. 
Quando é que São José ia mandar água de novo?

Morte

A alguém que sobreviveu à morte de alguém só posso oferecer minha tristeza.
Ninguém nunca me ensinou como oferecer condolências aos outros na ausência de fé. Condolências parece até sinônimo de oferecer fé em apoio ao outro. Sinto um constrangimento enorme quando preciso ir ao enterro de alguém ao ver todas as pessoas rezando e reforçando uns aos outros a fé de que algo diferente do que está no caixão está subindo em algum lugar e sendo recebido por alguém...
Sinto-me como se eu mesmo fosse uma interrupção nessa cadeia e evito trocar qualquer palavra nessa hora ou, simplesmente, digo sim a tudo que ouço, por mais absurdo que me pareça.
Mas também eu fico pensando como os velórios seriam terríveis se não fossem um momento de compartilhar esperanças - afinal continuamos vivos e algo em nós foi perfurado...Um pedaço de nós foi levado e parece que precisamos pôr algo no lugar.
Só não entendo por que esse algo deva ser "Deus"...

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Amores e outras...

Realmente, não sei cumprir muito bem o meu papel de apaixonado. Talvez seja por isso que eu esteja sempre à beira do paraíso e tente ser feliz ao vê-lo de longe.
Coisas que, me disseram, se aprende com a idade...Mas que mentira...
Talvez meu futuro seja mesmo o de ser o porteiro do paraíso, mas cego pras coisa lá de dentro.
Talvez meu paraíso seja apenas a porta do paraíso.
Mas olho e em volta e não vejo ninguém...
Só eu.
Porta de paraíso desacompanhado.
Sem olhos pra dentro e pra fora somente o horizonte.
E, em volta, meu pequeno pedaço de eu mesmo.

Sexo e religião

Quando nos encontramos foi que eu vi o quanto ele era grande. Alto, largo, pesado, forte, mas com algo no olhar que parecia cativar - ou, talvez, seja algo na minha cabeça que fazia qualquer coisa nele de cativante ou infantil ou doce...
Conhecemo-nos pela internet, claro. Um papo rápido, claro. Uma rápida troca de fotos, claro.
Claro, fomos a um motel...O papo rápido não permitia que no encontrássemos para uma cerveja ou um sorvete ou filme...Não queríamos ser amigos - se você está me entendendo!
Ao chegarmos na cama e começarmos a tirar nossas roupas comecei a vislumbrar algo de sua beleza interior, tatuada em sua pele branca como leite. Havia tatuagens por todo o peito...Mas elas não chegavam aos braços, eram bem discretas sob a camisa - mas sem a camisa elas eram realmente gritantes!
Quando ele se deitou cuidadosamente sobre mim eu pude finalmente ler o que estava escrito em seu peito com letras garrafais: "SOLDADO DE CRISTO". Com tal frase à minha frente foi que prosseguimos com as nossas carícias e foi estranho ter que beijar tal frase tantas vezes quando eu só queria beijar seu peito...
Ao virá-lo para me deitar sobre suas costas - pensando, no íntimo, em me livrar de ter que beijar aquela frase de novo, deparei-me com outra igual: "SOLDADO DE DEUS"...
Parei. Li de novo. Segurei o riso nervoso. Relaxei. Deixei meu corpo colar em suas costas novamente e beijei cada letra daquela frase. S O L D A D O   D E  D E U S ...
Suspirei... Oh, meu soldado...
Nunca pensei em religião durante o sexo. Nem se era pecado ou não ou se Deus estaria assistindo ou não...Essa foi a primeira vez, diante daquele homem tatuado de fé...Não consegui desligar. Ao abraçar, estava abraçando o soldado de deus. Ao beijar, estava beijando o soldado de cristo...
De frente, de costas...
De costas, de frente...

Soldado de Deus...
Soldado de Cristo...
Soldado de Deus...
Soldado de Cristo...
Como um mantra...Repetido tantas vezes que até eu já estava me sentindo um soldado de deus...Eu sou um soldado de deus. Eu sou um soldado de cristo...Oh, meu soldadinho...


domingo, 5 de maio de 2013

Onde...?

Não sei quando o perdi de vista.
Foi talvez dobrando uma esquina...Minha mente levantou um rápido vôo e ao retornar não estava mais lá. Corri de qualquer jeito, como se tivesse a certeza de que tinha sido naquela esquina - mas quando cheguei lá, com o coração já saltando pela boca, não havia ninguém que eu esperasse.

No amor, quando pensamos perder uma grande oportunidade, a mente se torna fértil em produzir arrependimento sobre tudo o que não teria sido feito.

A rua caiu por mim adentro com todo o seu caos de gente e carro. Os rostos desconhecidos e conhecidos se tornaram indiferentes e a minha ansiedade de ver somente um rosto é um peixe num minúsculo aquário - a ele é dado ver em todas as direções e não tomar nenhuma...

A rua se acendeu e se apagou em um segundo de pensamento em desvairio e quando o cansaço me permitiu olhar em volta, estava escuro e sem ninguém - a não ser um esmoléu aos meus pés com a mão estendida.

A rua se apagou e com ela a minha esperança e todas essas portas fechadas não são senão a metáfora de tudo isso.

Queda

Quando se cai lentamente, há, na lentidão, tempo para ensaio. Na queda lenta ainda opera um certo senso de dignidade - que, às vezes, tende vertiginosamente para a teatralidade e para o gesto calculado. O olhar daquele que cai percorre a paisagem e observa quem o observa. E, no perceber do olhar certo, se estende o palco para a sua próxima cena.
Quando a queda é rápida, já não há mais tempo. A perda do senso do ridículo frutifica sobre a dignidade em pedaços. Na face, as caretas espontâneas se formam em espasmos, as rugas, a boca aberta sem cuidado, o movimento randômico dos olhos, a cabeça sem descanso. As palavras saem, por vezes, mais sinceras que diplomáticas - pois que, enfim, perde-se o senso de diplomacia.
A ação desesperada e sem tempo de maturação dispara balas aleatórias, as quais estarão para o acaso decidir se acertarão algo que poderia ter sido um alvo.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Asfalto molhado

A chuva atravessou a rua surda e lançou o seu olhar úmido sobre os prédios. A luz por trás dela era estridente e amarela e perseguia as aves que fugiam. Espanta-me a chuva por ser assim, como que incompreensivelmente leve e aleatória, a mim por trás do vidro da janela. Me sussurra em segredo, mas todos ouvem seu sussurro e as palavras se despedaçam nos bueiros encharcados. E eu mudo, ali. Por trás. Como que parecendo incompreensivelmente leve e aleatório.

A luz atravessa a rua e chega até mim como a um vizinho que pediu açúcar ontem, no outro lado da casa, por sobre o muro mal-feito. E eu choro como criança ao sentir a aproximação não da luz que se aproxima, mas das sombras que ela no seu caminho mágico vai criando. O meu nariz escorre a água da chuva como bueiros invertidos e a minha boca sabe a lembrança da água marinha - bem na ponta da língua.

A lua dobrou a esquina, escapando impossivelmente da chuva - e na lama da noite, as estrelas desmaiadas no asfalto rogam para que a água não seque. O teu olhar é uma daquelas estrelas e eu saber que tu és isto é a minha melancolia maior das melancolias que por aí já tive.

O poste se se acende, enganado pelas nuvens que anunciaram uma noite precoce. Mas é noite mesmo e a chuva se vai no horizonte como uma noiva que sobe ao altar mas fugindo dele - com o olhar do noivo em ocaso...

A chuva se foi -  espalhando, por onde já não está, úmidas lembranças - e a última escorre em meu rosto, lágrima doce. O asfalto bruma...

Foge, danado! Que a lembrança de uma estrela que evapora seja a lembrança mais doce que por aí já tive...


Quando

Não daqui a cinco segundos.
Não daqui a duas horas.
Não hoje à noite.
Não amanhã.
Não no final de semana.
Não no mês que entra.
Não daqui a um ano.
Nem no próximo século.

Não há um segundo atrás.
Não há dois minutos...
Não ontem, nem anteontem nem semana passada.
Não no mês passado e nem no ano passado.
Não na fotografia
E nem no DVD
E nem no facebook...Ou no celular.

Agora.
Somente agora.
Agora.

Fora do agora sou mera expectativa ou lembrança.


Existo somente agora.
Existo somente agora.
Existo somente agora.
Existo somente agora.

Silêncio

O silêncio só nos devora quando temos algo a dizer.
O silêncio devorador tem sempre algo a dizer que não por meio do próprio silêncio.
Está sempre cheio de palavras,
ruídos,
sons,
cor,
intenção,
ação,
gesto.

O silêncio devorador não é silêncio,
mas angústia sem sons,
   boca fechada,
      mãos atadas,
         bomba-relógio.

Eu busco um silêncio que é tão silencioso que pode até conter sons.
Que é tão expressivo que dispensa palavras.
Que é tão sólido que age mais do que a ação.
Que é puro e mudo gesto.


O teu silêncio são nuvens cinzas de chuva que buscam o meu solo para chover
E o meu solo seco se abre para a tua chuva.
Mas o que brotará dessa água
Se nada tiver sido semeado?

O meu silêncio é um solo seco em busca de chuva.
Tudo brotará quando a água vir.

O meu silêncio é a caatinga depois da chuva
E o cheiro de mato que sobe e se espalha com o vento.
Os animais vêm e se sentam em minhas poças.
As plantas ficam verdes,
As jaçanãs ficam fartas.
O ar, úmido.

E eu faço as pazes com o sol.

Esquina

O cheiro me parou,
Como de costume...
Mas, desta vez, olhei o jasmineiro nos olhos
E chorei.

Na esquina,
O cheiro de jasmim era um choro...

Pseudo Blues

Acordei hoje cantando essa música...
"O certo é incerto
O incerto é uma estrada reta
De vez em quando acerto,
Depois tropeço no meio da linha" (Marina Lima)

O certo é incerto...
O incerto é certo...
Tropeço sempre e caio no meio da estrada reta.

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Um

Meu coração apertado
Por não estar cheio...

E a voz que me falta sem faltar as palavras.

O silêncio dos barulhos da rua,
Os berros de ninguém,
O olhar que me atravessa...

Só o perfume do jasmineiro na esquina me surpreende -
E com a força de um beijo me arrebata.
Por que eu sempre me esqueço
               que ele está ali...]

Lua



Na varanda,
Uma bola no azul
Entre os retângulos dos prédios...

No alto do fim da rua,
Sobre os carros.

Não sei se é cheia
E nem me importa.

Lenta, lenda, linda..

terça-feira, 23 de abril de 2013

Aqui

Aqui,
Na varanda.
A tarde cai e eu acompanho sua                  queda...]

Pastor Feliciano (e por trás)

Esse pastor tem dado muito a falar nos meios de comunicação de massa e nas redes sociais. A grande mídia se põe em consenso sobre esse assunto e todos parecem agora firmemente decididos em defender os direitos humanos: a Folha de São Paulo, a Globo, a Veja, o O Povo, o Diário do Nordeste etc. E meus amigos, e todos os setores chamados progressistas,  não param de reproduzir aquilo que se reproduz nessas mídias nas redes sociais. Na aparência, a grande maioria da sociedade brasileira encontrou finalmente o seu consenso.

Mas uma coisa me preocupa bastante. O problema não é o pastor Feliciano e as coisas que ele diz. Ele tem muita coragem para dizer aquilo que diz e ir contra o mainstream da opinião pública e da grande imprensa. E isso não precisa ser um elogio a ele e às coisas que ele defende. O maior problema é de onde vem essa coragem.  Aquelas pessoas, que são milhões e, mesmo sendo milhões, se sentem constrangidas em dar sua própria opinião no facebook ou na imprensa...E se contentam em se expressar apenas para o seu próprio público interno e para as comunidades de que fazem parte.

Com os governos de esquerda que sucederam a era de direita do sr. FHC, o Brasil aprovou muitas coisas que são consideradas de vanguarda no mundo contemporãneo: leis em defesa das mulheres, dos negros/afrodescendentes, dos gays/lésbicas/trans/etc etal.

Mas eu me pergunto se com essas leis o debate cultural com aqueles que pensam fora vencido e se esse debate precisa, necessariamente, ter vencedores.  E chamo a atenção para a questão da homofobia (apesar de o debate sobre aborto ser também nteressante nesse sentido).

Existe uma sensação de que um estamos em um momento de crescimento do conservadorismo. Essa fase ascendente de conservadorismo também tem penetrado o meio gay/lésbico pelo lado de um fortalecimento das idéias de casamento. A conversa agora não é apenas, como o movimento homossexual de esquerda apregoava, de estender os direitos de propriedade aos relacionamentos homoafetivos. Trata-se do "direito" ao casamento e não só isso, o "direito" ao sacramento do matrimônio. Ou seja, o "direito" de casar na igreja. Por que coloco a palavra direito entre aspas. Por que em se tratando de cultura e religião, principalmente religião (que é um dos focos desse artigo), a noção de direito parece-me mais limitada. Pois pode o Congresso Nacional legislar em matéria de fé e decidir que Deus, seja lá o que isso seja, e as religiões devem ser tolerantes e acolher os fiéis como eles são etc e tal.

Tenho a convicção de que Deus tem os preconceitos daqueles o criaram, pois ele é a imagem e semelhança dos seus crentes.

Tenho a convicção de que todos podem ter a religião que melhor lhes aprouver, com o Deus, os sacramentos, doutrinas adequados a ela.

Tenho a convicção de que o debate cultural não será vencido, mesmo que uma lei faça parecer que há um vencedor. E que portanto temos que nos acostumar com a diversidade.

A lei não serve para mudar essa realidade mesmo que a mude parcialmente. A lei serve para que que não nos matemos por causa dessas diferenças. Pois, não será a chacota e o humor pesado e generalizante um forma de violência contra aqueles que pensam diferente?

Todo e qualquer um tem o direito inalienável de dizer que eu vou para o inferno quando eu morrer. Todo e qualquer um tem direito a dizer que não sou filho de Deus, que satanás é o meu mestre, que vivo uma vida de pecado e luxúria e tudo e qualquer coisa que frutifique de sua mentalidade religiosa. Toda igreja tem o direito de dizer que não pode celebrar o meu casamento com outro homem por isso ser contra a lei de Deus.

Os heterossexuais têm todo o direito a terem orgulho de si mesmos, de promover beijaços heteros, abraços heteros, e têm direito à heteroafetividade e a criar seus filhos da maneira que o amor a eles os conduza. Deus, se ele existir, me livre de uma mundo que troque a hegemonia total do comportamento heterrosssexual (seja lá o que isso seja) pelo do comportamento GLBTTXYZ (seja lá o que isso seja).

Eu não me importo em absoluto com isso. Contanto que eu não possa matar por causa disso e nem possa ser morto pelo mesmo motivo.

Quem quiser casar na igreja, que faça como os americanos fizeram: criem suas sinagogas gay, igrejas presbiterianas gays, batistas gays, igrejas unitária etc - e resolvam isso consigo mesmos. Mas não queiram forçar o Deus de ninguém a ser tolerante. Devemos convencer as pessoas a serem tolerantes, não Deus, que, talvez, virá por acréscimo.


Parece-me que, no fundo desse movimento contra o sr. Feliciano, existe uma espécie de cruzada cripto-católica contra os evangélicos. E é uma pena, pois o crescimento do fundamentalismo não é um fenômeno ligado exclusivamente à ascensão das igrejas evangélicas - é um fenômeno que acontece internamente na igreja católica e que teve como fruto principal o sr. Bento XVI. E o modo como essa cruzada esta sendo amplificada pela esquerda e pelos setores progressistas não ajuda a dialogar com os evangélicos e nem a ajuda a percebê-los em sua diversidade e sua dinâmica. Na verdade, empurra-os a uma posição defensiva que coloca igrejas de posições opostas como aliadas contra essa cruzada.

A coragem do pastor Feliciano vem daqueles setores apavorados com a dissolução dos valores tradiconais. Mas também de um pavor com a desordem geral de valores. Por que uma das facetas da nossa crise de civilização é que parece que ninguém mais pode ter valores morais, ninguém mais pode ter uma visão do que é certo e do que errado, ninguém mais pode ter um limite de conduta e que ninguém mais pode nem sequer falar sobre isso.

Por que é isso que o capitalismo precisa, para quebrar toda e qualquer amarra à sua sanha de produção e reprodução de mercadoria até que não reste mais nenhuma mínima faceta da vida humana que não seja vendável ou comprável. E nisso, eu sinto o mesmo medo.  
Os jovens da esquerda fazem pilhérias daqueles que fizeram opção de não beber álcool, daqueles que se comprometem a ter sexo somente depóis do casamento, daqueles que optaram por não usar drogas. Mas eu me pergunto se a alternativa que esses jovens ditos revolucionários  apresentam é realmente uma alternativa á crise civilizatória ou é ela mesma um sintoma dessa crise. A alegria que vejo na face desses jovens é uma alegria histriônica, permanente, uma alegria bêbada e hiperexcitada que não me aparece como o frescor da utopia da emancipação, mas com a aura cadáverica do mundo da mercadoria na sua aparência mais beco-sem-saída - e que na verdade esconde uma grande frustração com a vida.

Mas, é claro, Feliciano não é uma resposta que eu considere. Nem o sr. Bento XVI. Nem muito menos a Veja, a Globo ou a Folha de São Paulo...

A esquerda se recusa a dialogar ou a patrocinar o diálogo...Preferem demonizar os pastores e reforçar (mesmo que indiretamente) a cruzada catolicizante e a guerra entre as religiões. Ninguém precisa concordar com ninguém. A única concordância deve ser em relação aos direitos civis, a verdadeira cruzada é contra aqueles que incitam mesmo a violência e se o pastor Feliciano faz isso vamos tratá-lo como um criminoso, e no espírito dos direitos humanos dados aos criminosos. E não como um demônio, origem de todos os males. Ele que diga o que quiser na igreja dele e que nos mande a todos para o inferno, pois é isso que as religiões fazem com "os outros" que estão fora do âmbito da sua própria fé mesquinha. O Deus dele pode ser o quiser. Não quero legislar nesse domínio, senão vamos abrir uma temporada de caça às bruxas que nos parecerá "legítima" - mas que mais adiante se voltará contra nós mesmos.


segunda-feira, 22 de abril de 2013

Deus

"Quem é ateu e viu milagres como eu..."
(Caetano Veloso)


Não é que eu não acredite em Deus. Eu acredito em tudo. A saudosa Lyálorixá Mãe Menininha do Gantois costumava dizer algo que gravei imediatamente: "Acima de Deus, nada. Abaixo de Deus, tudo". Durante muito anos essa frase foi um koan objeto de minhas meditações. E eu que já tinha tido tanto preconceito contra o candomblé e as religiões africanas! Uma frase de Mestre, de mestre com M maiúsculo.

E, mais do que isso, uma frase muito zen. E a chave para isso está na palavra "tudo". Tudo, inclusive Deus. Uma frase circular quando vista por este ângulo. Ou Deus seria algo de tão absolutamente absoluto que seria fora de todo tudo. E nesse caso, seria uma frase circular do mesmo jeito. Um tal Deus estaria absolutamente fora de nosso alcance. Do alcance de nosso pensamento, inclusive de nossa fé.

Uma outra coisa interessante me disseram outro dia também sobre Deus. Que Deus é luz, mas você não deve olhar diretamente para ele - pois luz demais, cega. É luz para se olhar em volta. E, outra vez, as sombras aparecem. Pois tudo o que há em volta só pode ser visto por um jogo de luz e sombras. Quando se olha diretamente para Deus, nessa metáfora, ele se transforma em Lúcifer, a própria figura da sombra que carrega luz no seu nome.
Deus não é fácil. mas também não precisa ser difícil. É fácil usar Deus como motivação máxima não só dos nossos desejos mesquinhos de oprimir e matar os outros em nome da (nossa) religião. É facil usá-lo também para justificar nossa capacidade de amar e acolher os outros.

Eu, do meu lado, não gosto muito de usá-lo. Prefiro deixá-lo livre e justificar minhas ações com minha humanidade e com tudo o que carrega alguém que tem como origem, casa e abrigo o planeta terra e tem como pai, mãe, irmãos, tios, avós e primos, toda a vida orgânica e inorgânica desse planeta.

Hoje em dia, convido todos os Deuses à minha casa. Não tento ver a face oculta de cada um deles - senão não seriam o que são, mistérios. Tento conversar com eles deixando-os cobertos com os véus que lhes são próprios e a minha casa se enche de névoa e, ao mesmo tempo, da luz que dizem carregar. Luz que causa sombras, pois só há sombras quando há luz! Por isso é bom quando chegam de dois ou mais, pois com mais luz em diferentes espaços, as sombras recuam.

Recuam, mas não desaparecem. Pois se as sombras desaparecerem, terá sentido ainda falar em luz?

domingo, 21 de abril de 2013

O Outsider Zen

Estou em todos os lugares provisoriamente.
Na verdade, isto é que não estou em mais lugar nenhum...
Estou atrás quando penso que estou à frente,
Estou de lado, no meu ponto cego.
De lado, no seu ponto cego também...
No espelho, sou como um vampiro,
Vejo tudo e todos, mas não vejo a mim...Só quando me pinto!
No espelho só vejo o personagem, não a mim.
Só vejo a tinta...
A tinta sou eu para mim
E eu sou eu, aparentemente, para você - aquele que não me vê pelo espelho,
                                                               mas na vida real.]
Sou assim.
Estou assim.
No vento...No sonho...Na fantasia...
Provisório.